A medicina de emergência tem foco no atendimento de doenças agudas e ameaçadoras à vida.
No entanto, muitos dos pacientes que procuram o pronto-socorro estão em fase final de patologias crônicas, onde o tratamento agressivo pode ser ineficaz e ter pouca influência modificadora no curso da doença.
Apenas em 2006, 250 mil pessoas chegaram mortas ou morreram em pronto-socorros nos EUA(1). Em levantamento feito em 502 pacientes admitidos na unidade crítica de emergência de nosso serviço, 33% preenchiam critérios para cuidados paliativos. Apesar desta realidade, menos de 18% dos estudantes e residentes recebem formação em cuidados paliativos e a literatura existente é escassa(2,3).
Uma revisão recente(4) avaliou estudos para identificação de pacientes com necessidade de cuidados paliativos na emergência. Apesar da variabilidade entre os estudos e instrumentos utilizados, existem pontos que podem ser integrados numa abordagem simples, aplicada em 1-2 minutos pelo enfermeiro ou pelo médico que realiza o primeiro atendimento:
População alvo: O paciente tem mais de 65 anos e/ou uma doença crônica avançada? (câncer metastático, demência avançada, insuficiência cardíaca com classe funcional IV, doença pulmonar crônica com dependência de oxigênio domiciliar)
Prognóstico: Você se surpreenderia se este paciente morresse no próximo ano? E nessa internação?
Considerações: Há perda de funcionalidade do paciente e/ou múltiplas procuras ao pronto-socorro/hospitalizações?
Os pacientes identificados através da resposta positiva a estas perguntas muitas vezes podem se beneficiar de:
Idealmente, o plano de tratamento deve ser elaborado na forma de decisão compartilhada. O médico apresenta as opções de tratamento proporcionais à situação atual e trajetória de doença. Dentre estas opções é escolhida a que esteja de acordo com os valores e preferências do paciente.
Pode-se utilizar um instrumento validado como o protocolo SPIKES(5) para que a comunicação de diagnóstico, prognóstico e o planejamento terapêutico aconteçam de forma mais organizada e completa.
No futuro, esperamos que haja uma rede de suporte para intercorrências em pacientes com doença avançada, seja através de hospital-dia, atendimento domiciliar ou em pronto-atendimento ambulatorial.
Enquanto esses recursos não são criados, os pronto-socorros continuam sendo o local em que estes pacientes conseguem atendimento imediato. Portanto, faz parte do dia a dia do emergencista: identificar as necessidades desse subgrupo de pacientes, realizar controle de sintomas de forma rápida e eficaz, avaliar prognóstico e proporcionalidade de intervenções e assistir ao paciente em processo ativo de morte.
Dra. Sabrina Corrêa da Costa Ribeiro
Disciplina de Emergências Clínicas-HCFMUSP
[email protected]
Referências
1. S.R. Pitts, R.W. Niska, J. Xu, C.W. Burt National Hospital Ambulatory Medical Care Survey: 2006 emergency department summary. Natl Health Stat Report, 7 (2008), pp. 1-39
2. M.A. Giosondi A case for education in palliative and end-of-life care in Emergency Medicine. Acad Emerg Med, 16 (2009), pp. 181-183
3. A.M. Sullivan, M.D. Lakoma, S.D. Block The status of medical education in end-of-life care: a national report
J Gen Intern Med, 18 (2003), pp. 685-695
4. George N, Phillips E, Zaurova M, Song C, Lamba S, Grudzen C Palliative care screening and assessment in the emergency Department: a systematic review. J Pain Symptom Manage. 2016 Jan;51(1):108-19.e2. doi: 10.1016/j.jpainsymman.2015.07.017. Epub 2015 Aug 31.
5. Baile WF1, Buckman R, Lenzi R, Glober G, Beale EA, Kudelka AP. SPIKES-A six-step protocol for delivering bad news: application to the patient with cancer. Oncologist. 2000;5(4):302-11.