O infarto com supradesnivelamento do segmento ST quando bem estabelecido no eletrocardiograma é um dos diagnosticos com condutas mais bem estabelecidas no pronto-socorro. O paciente logo deve receber dupla antiagregação. Nos centros que dispõem de serviço de hemodinâmica e cardiologia intervencionista, o paciente deve ser imediatamente encaminhado para realização de angioplastia primária. Nos centros que não dispõem e que encaminhamento em tempo hábil é logisticamente impossível, aceita-se a opção menos ruim de instituir tratamento trombolítico – sabendo que é melhor do que não fazer nada.
No entanto, existem situações clínicas e padrões eletrocardiográficos sutis em que não é possível identificar claramente o supradesnivelamento de segmento ST mas merecem terapia equivalente.
O infarto agudo do miocárdio relacionado a oclusão de artéria que irriga a parede inferior do ventrículo esquerdo pode se expressar com supradesnivelamento do segmento ST. Em alguns casos, o supradesnivelamento é sutil, podendo até não corresponder ao limiar mínimo de 1mm exigido em consenso para o diagnóstico, ou então podem estar presentar apenas ondas T hiperagudas. A presença de supradesnivelamento sútil associado a presença de repolarização precoce ou padrão masculino em derivações précordiais pode aumentar a confusão com diagnósticos alternativos como pericardite, repolarização precoce benigna aneurisma de ventrículo esquerdo e hipertrofica de ventrículo esquerdo.
Alguns estudos demonstraram que o segmento ST em aVL pode ser útil para se fazer o diagnóstico de IAM, e fazê-lo de maneira precoce. Em estudo com 107 pacientes, 14 pacientes tinham supradesnivelamento de segmento ST inferior menor que 1mm(1). Metade desses evoluiu para aumento superior a 1mm com o tempo. 11 pacientes tinha algum grau de infradesnivelamento de segmento ST em aVL.
Em estudo com 154 pacientes (2) com confirmacão angiográfica de infarto inferior – sendo 88% coronária direita; 11% circunflexa; 1% artéria descendente anterior distal e 1% ramo marginal esquerdo – 100% dos pacientes tinha algum grau de infradesnivelamento de segmento ST e inversão de onda T na derivação aVL. Até mesmo a presença de supra ST inferior foi um sinal eletrocardiográfico menos sensível (vide a Tabela). Outro sinal eletrocardiográfico interessante é o alargamento do intervalo QT corrigido pela fórmula de Bazett na isquemia. Trata-se de sinal específico (96%) mas pouco sensível, ou seja, não ocorre na maioria dos casos, mas quando ocorre é praticamente definitivo.
Alguns pontos merecem destaque. Este algoritmo não se aplica à pacientes com bloqueio de ramo esquerdo!. O autor sênior do trabalho, prof. dr. Smith deixa claro que o infradesnivelamento do segmento ST em aVL visto no estudo pode ser tão mínimo quanto 0,25mm(3). Não há relação com o significado da alteração em aVL com alterações do segmento ST em V5 e V6.
Portanto em casos de suspeita de síndrome coronariana aguda com supradesnivelamento de segmento ST não significativa inferior mas mínimo infradesnivelamento de segmento ST em aVL fique atento para o caso, se possível encaminhe o paciente para hemodinâmica ou centro com hemodinâmica, repita ECG a cada 15 minutos e mantenha o paciente monitorizado.
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Tabela 1. Sinais para diferenciação de supradesnivelamento de segmento ST correspondendo a IAM ou outras condições
SINAL | Sensibilidade | Especificidade |
---|---|---|
Segm. ST não côncavo | 77% | 97% |
Infra ST aVL | 97,3% | 100% |
Inversão T avL | 100% | 86% |
Supra ST inferior | 87% | — |
Supra DIII > DII | 88% | 100% |
QTc > 450ms | 28% | 96% |
Por Dr. Júlio Flávio Meirelles Marchini, Professor Colaborador da Faculdade de Medicina da USP, Supervisor da Residência de Medicina de Emergência e um dos coordenadores do curso de Medicina de Emergência da USP. [email protected]
Referências